Modelo de descapitalização do crime organizado chamou a atenção daONU.
- revista ofederal
- 15 de ago. de 2023
- 3 min de leitura
Seguir a pista do dinheiro movimentado pelo crime organizado no Brasil requer mudança de paradigmas. Com esse entendimento, a Polícia Federal tem buscado implementar estratégias para descapitalizar organizações e facções criminosas. Esse modelo de investigação chamou a atenção do escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, o qual manifestou interesse em mostrar o exemplo brasileiro para outros países seguirem.
A tática também levou a PF a registrar recordes de apreensões e bloqueios de bens do crime organizado, em 2020, em plena pandemia de Covid-19. O assunto chegou a ser abordado em entrevista concedida pelo delegado de Polícia Federal Elvis Aparecido Secco à revista Americas Quarterly (AQ), de circulação internacional e traduzida em três idiomas.
O delegado que, foi coordenador-geral de Repressão a Drogas, Armas e Facções Criminosas (CGPRE) da Polícia Federal, tem difundido esse modelo de investigação, também, em eventos locais, a exemplo da edição online do 3º Simpósio Internacional de Segurança - As Inovações Tecnológicas no Combate à Criminalidade, realizado pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), por meio da Diretoria Regional-DF, em outubro do ano passado.
A principal prática que a Polícia Federal tem buscado atacar é a lavagem de capitais, crime popularmente conhecido como “lavagem de dinheiro”, que consiste em dar aparência de legalidade a recursos obtidos de forma ilícita, seja por meio do tráfico de drogas, armas, pessoas ou mesmo em ações e corrupção, o chamado “crime de colarinho branco”. Elvis Secco alerta para o fato de que a lavagem de dinheiro é o que sustenta a estrutura das organizações criminosas, daí a estratégia de atingir principalmente o núcleo financeiro em detrimento da apreensão de drogas, armas ou outros produtos ilícitos.
Pois estas apreensões, segundo constatou a Polícia Federal, não representam grandes perdas para os criminosos, o que não significa que essa frente também não será atacada. “A única maneira de desmantelar estas organizações é despojá-las de recursos.
E para efetivamente descapitalizá-las, precisamos interromper sua operação de lavagem”, defende o delegado. Segundo ele, para que isso funcione, a colaboração internacional é fundamental. Essa abordagem mais capitalista de repressão ao tráfico de entorpecentes é uma prática já preconizada pelo delegado federal Getúlio Bezerra, primeiro diretor de Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal.
O delegado Bezerra conta que o conceito de visão capitalista da repressão foi concebido nos anos 1990, na Academia Nacional de Polícia (ANP). Naquela época, a Polícia Federal atuava com esse conceito, mas de forma limitada, em termos de tecnologia, e com pouco embasamento legal e doutrinário. “A interceptação telefônica era artesanal.
O confisco de bens e lavagem de dinheiro eram incipientes”, lembra. Segundo ele, essa cultura foi sedimentada na academia e difundida nas aulas durante os cursos de formação.
A partir dessa mentalidade de descapitalizar as organizações criminosas, a Polícia Federal foi se estruturando e dividindo a atuação em departamentos, na década de 2000, quando foi criada a Diretoria de Combate ao Crime Organizado, hoje CGPRE. Em paralelo, o Brasil aderiu a convenções internacionais de combate ao crime e criou legislações específicas, com novas dimensões operacionais.
Além disso, a cooperação internacional também já era realidade e se configurava como fundamental para desestruturar a espinha dorsal das organizações criminosas. Bezerra chama a atenção para a importância da cooperação interna entre órgãos que atuam no combate ao crime e aplicação da lei.
Desarticulação financeira
Para intensificar essa estratégia, a Polícia Federal adotou algumas medidas, a partir de 2019. Foram criados escritórios, os chamados “grupos especiais de investigações sensíveis”, voltados exclusivamente para o combate à lavagem de dinheiro do tráfico de drogas. Dentro desses grupos foram colocadas três unidades com atuação também exclusiva no combate ao tráfico e à lavagem de dinheiro. Com esse método, os principais líderes das grandes organizações foram atingidos e as operações foram divididas em fases. Como exemplo, Getúlio Bezerra lembra que, do total de R$ 1,2 bilhão em bens sequestrados e como consequência da desarticulação financeira, em 2020, quase R$ 700 milhões foram retirados do Primeiro Comando da Capital, o PCC, maior e mais famosa organização criminosa do País. Esse valor registrado em 2020 foi o recorde de apreensões e bens sequestrados do crime organizado, em uma década: em 2011, foram R$ 40,4 milhões (ver gráfico). Além disso, operações deflagradas, em 2020, em plena pandemia, contaram com a cooperação de países da Europa, da África e América do Sul, num esquema de deflagração simultânea, cumprimento de ordens judiciais internacionais e identificação de núcleos financeiros dentro e fora do Brasil.
Fonte: ADPF ( Associação dos Delegados da Policia Federal )

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